quinta-feira, 17 de julho de 2008

Ela.

Magritte

De longe eu a observava. Seus movimentos pareciam vindo de um transe e traduzia sua vontade de integrar-se àquela massa disforme de rostos e pessoas. Os movimentos que ela fazia com o corpo e com os cabelos, eram comuns para a maioria que nos rodeava, todos faziam o mesmo, seguindo o som grave dos surdos e dos batuques do maracatu. Mas ela tinha algo mais: tinha graça, uma beleza indiscreta e sedutora, incenava num palco imaginário seus encantos e sua feminilidade, como se não houvesse nada mais ao redor.

Mas eu via além do belo espetáculo da beleza que fora vendido. Via incenado no seu palco, angústia. Ouvia o grito silenciado dos seus anos sofridos, das suas dores contidas, dos seus medos guardados e o vazio da graciosidade dispensada aos homens que a rodeava com desejo. Via na indiscrição da sua dança, pedidos discretos de ajuda.

Queria tê-la por perto. Não conseguia mantê-la ao meu lado, ninguém conseguia. Era um espírito livre que fazia um esforço tremendo para fazer parte de algo, e um maior ainda para ser alheia a ele.
E de longe eu a observava, linda, sedutora, triste. Tão longe de mim, tão distante de sí.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Desabafo

M.C Escher

Que me desculpem o desabafo, mas a verdade é uma só: Isso de querer tirar interpretação de fatos que nos acontecem inesperadamente, de fazer mudanças repentinas e desajeitadas para uma reorganização de vida que parte do pressuposto que- " tudo que ocorre, ocorre por uma razão" - para mim é desculpa de comodidade. Não sei lidar com o que não planejo e tenho a ilusão de que controlo tudo. Sim, adimito que seja uma ilusão, pois o inesperado acontece, situações nos são impostadas, mas eu caminho novamente, em direção oposta, para reestabelecer a ordem abalada, se é ali que acredito que eu deva ficar. Quem dita o que acontece comigo sou eu! E mesmo que eu não controle todas as variáveis de minha vida, escolho o que fazer com elas. Não sou contra mudanças, pelo contrário, sou a favor de um abalo sísmico subjetivo, ora ou outra, para termos a oportunidade de repensar pontos de vistas, questões morais e comportamentos. Mas adequar situações com pesar, porque assim deve ser? Nem morta!
Além dessa ilusão de controle e auto suficiência, sofro de outros males: neurose, fixações e paranóia. E não, não acredito que eu seja homossexual pelo último mal descrito, ou talvez seja, mas isso não é importante no momento. O que importa é que vez ou outra a forma como vivo não se adequa ao que considero correto: tenho comportamentos absurdos, atitudes irracionais e um estilo de vida que, gostaria absurdamente de mudar, para ser diferente do que sou. Entretanto, como sou também a parte que não quero de mim, dou um jeitinho de encaixa-la alí e formar a conjuntura de unicidade. Por mais bizarro que pareça, escolhi viver de fragmentos e vivo bem, obrigada. Feliz? Ora ou outra, o que já é suficiente, ou vocês acreditam em felicidade eterna? Por favor!
Fora isso, ainda fazendo jus ao título deste texto, sou extremamente egoísta, tudo deve ser do meu jeito, porque obviamente é o mais correto. Sou arrogante e só sei falar de mim, bem digam os posts desse blog.
Mas ao contrário do que possa parecer, me divirto com minhas características, por piores que sejam julgadas e me sinto bem por tê-las, porque sou verdadeira.
Claro eu também sorrio quando não quero, socializo por conveniência, presto favores contrariada. Tenho uma bondade que se manifesta, principalmente nos dias de inverno. Gosto de ensinar. Gosto de criança de rua.

Mas manifestar bondade para conseguir alguma coisa? Nunca. Agradar alguém para ter garantia de companhia sempre? Jamais! Fingir fragilidade para ter o apoio? Nem morta!

E acreditem vocês, tem gente que consegue me amar. Explicação para isso só encontro num fragmento da Clarice Lispector....."Isso lhe assusta? Creio que sim. Mas vale a pena. Mesmo que doa. Dói só no começo."